Pedro Pesquisa, o atual presidente da Ala dos Compositores da Mocidade, abriu-nos a porta do seu apartamento no Centro da cidade e por trás do seu inseparável óculos escuros relatou-nos sua larga experiência em composições musicais.
Ficamos sabendo que Pedro de Almeida Trindade - ou "Pedro Pesquisa", como é conhecido - além de compor sambas campeões do Carnaval de Guarapari, é também compositor de xotes e boleros. Durante a entrevista para a série Velha Guarda, Pedro apresentou-nos suas gravações e recortes de jornal sobre a sua participação nos festivais de música. Em 2001, Pedro participou da XVIII edição do Festival da MPB de Alegre. Até aquele ano, Pedro já possuía mais de 150 composições, incluindo as vitórias no Concurso de Marchas Carnavalescas de Brasília, em 1961, e no Festival da MPB de Brasília, em 1962.
Extremamente empolgado em falar da colaboração que deu ao Carnaval de Guarapari, esse carioca que passou a infância em Copacabana e a adolescência na Gávea fez questão de ressaltar que muitas de suas composições tiveram a parceria de gente boa como seu grande parceiro Tavinho, filho de Arnaldo Cidade.
Através das palavras cheias de emoção, descobrimos um homem apaixonado pela Mocidade Alegre de Olaria. Disse, entre outras coisas, que seu sangue é azul e branco tal qual a bandeira da Escola de seu coração. Apesar de participar de outros concursos de samba de enredo, é na Mocidade que ele se sente realmente em casa. E, quando está compondo para a escola, sente o corpo arrepiar e a composição flui suavemente. A primeira composição para a Mocidade ocorreu em 1981, quando a escola apresentou o enredo "Hoje é o Dia da Sorte", mas na verdade, o primeiro samba que de fato foi para a avenida embalou os foliões do GRES Unidos de Guarapari, em 1984, com o enredo "No Circo da Vida, o Palhaço é o Folião". Pedro continuou compondo para a Unidos até 1986.
A grande vitória de Pedro Pesquisa na Mocidade aconteceu finalmente em 1994, quando o Carnaval de rua de Guarapari retornou depois de vários anos estagnado devido à política local. Em 94, o compositor concorreu e viu seu samba embalar a Mocidade com o enredo "Deu Teia de Aranha no Samba".
Além dos diversos discos gravados que nos mostrou orgulhoso, encontramos uma reprodução fotográfica de um toureiro e a inscrição "Pedro Pesquisa - El Niño de La Capea".
Leia, a seguir, a entrevista de Pedro Pesquisa, o "Garoto da Capa".
1- Desde quando você compõe para a Mocidade?
R: Desde 1981.
2 – Você é natural de Guarapari?
R: Eu nasci no Rio de Janeiro. Mas, sempre tive vínculo com Guarapari porque a minha família é toda daqui. Pesquisa é meu nome artístico. Eu sou da família Almeida Trindade. Nas férias,desde pequeno, eu sempre passei dois meses dentro de Guarapari, por isso me considero guarapariense.
3 – Há alguma diferença entre a Mocidade de hoje e a do passado?
R: No passado houve uma pujança maior. Havia uma concorrência maior de compositores. Cheguei a disputar samba na Mocidade com 12 sambas concorrentes. Há pessoas que hoje não estão mais compondo, como o Dudu Azimuth, Dito, o falecido diretor de bateria Edson Germano, Toninho Balbino e Jorginho Carvoeiro. Em média, eram doze ou treze sambas concorrentes. A escolha de samba enredo era uma festa. Hoje em dia isso praticamente não existe mais.
4 – A que você atribui essa desmotivação dos compositores?
R: Não acho que seja desmotivação. Foram vários fatores: alguns tem um série de compromissos, outros mudaram de endereço, alguns continuam na escola mas pararam de compor e além disso não houve uma renovação da ala dos compositores, com excessão de Rogerinho do Cavaco, que é a mais recente renovação da Mocidade. Isto eu falo como atual presidente da Ala dos Compositores.
Assim sendo, precisamos criar um quadro novo de compositores com a participação de jovens. Tavinho e eu somos veteranos dentre os compositores. A Mocidade precisa oxigenar essa Ala de Compositores dando ênfase aos jovens e fazendo com que eles venham a compor, colocando para fora esse amor pelo samba e pela escola.
5 – Você também expressa esse amor em suas composições, não é mesmo?
R: O azul e o branco da Mocidade Alegre de Olaria estão no meu sangue. A Olaria, para mim, é uma paixão. Não uso apenas a “arquitetura” na composição de um samba, mas sim o amor pela Escola. A “Olaria” para mim é diferente.
Eu também ganhei samba na Juventude e quando vou aos ensaios daquela escola, me sinto como um “peixe fora d’água”. Olaria é a minha casa... O calor humano é outro. Por que eu sou Mocidade. Inclusive em uma conversa com Tavinho, meu parceiro há mais de quinze anos, vimos que nós dois temos o mesmo sentimento.
6 – Você acha que a Mocidade poderia estar desfilando no Carnaval de Vitória, no Sambão do Povo?
R: Conversando com Tavinho, nós avaliamos a “Olaria” e achamos que o padrão da escola, dentro do quadro atual, é acima do padrão de Guarapari. É um padrão de Vitória. Tenho certeza que podemos brigar “pau-a-pau” com qualquer escola de vitória. O que falta é incentivo financeiro. Elemento humano nós temos de sobra. Nosso samba não deve nada ao de Vitória. Vitória tem um estilo de samba paulistano, e o nosso tem o estilo carioca. Você percebe pela harmonia do samba de Guarapari que nossa influência maior é o Rio de Janeiro. A cadência do nosso samba é completamente diferente da cadência do samba de Vitória.
7 – O que falta para a Mocidade?
R: O que nós precisamos dentro da Mocidade é de uma renovação. Precisamos achar um meio de atrair os jovens. Nós deveríamos fazer promoções, assim como no Rio, durante o ano todo. No Rio tem as famosas rodas de samba do Cacique de Ramos, da Mangueira, do Império...
8 – É essa falta de promoção que faz com que a comunidade se disperse?
R: É. Ela só aparece no Carnaval. Certa vez fizemos uma roda de samba na casa de Rogerinho do Cavaco. Não coube tanta gente que foi. O pessoal está carente disso. E a comunidade se reuniu ali. Se isso fosse feito no campo do América, por exemplo, todo mês, ia chegar mais jovens.
No passado, nós tínhamos evento o ano todo. Vinha Jorginho do Império, Dominguinhos do Estácio. Teve um período muito rico também, quando Paulo Loureiro cedeu uma sede para a Mocidade de Olaria no bairro São Judas Tadeu e os eventos eram ali. Os ensaios da escola eram ali naquela sede e a Escola trazia grandes nomes do samba brasileiro. A Unidos de Guarapari trouxe Cartola, Nelson Cavaquinho. Elke Maravilha desfilou em Guarapari com um samba meu. Naquele tempo, as escolas faziam promoções o ano inteiro. Sempre havia dinheiro em caixa. Não dependia apenas da Prefeitura. Essa falta de promoção foi o anti-clímax que determinou um pouquinho de queda no carnaval de Guarapari, mas a Mocidade, mesmo assim, conseguiu manter um padrão de qualidade no samba, no modo de desfilar.
9 – Como é o samba da Mocidade Alegre de Olaria?
R: Não sei se é porque temos mais amor pela escola, mas quem escuta de longe sabe que lá vem a Mocidade. Até mesmo os compositores da Mocidade têm uma linha de compor diferente das outras escolas.
10 – O que mais te traz saudade em relação ao passado?
R: Os amigos que “partiram antes do combinado”, como o meu grande amigo Edson Germano e diversos outros amigos meus que já partiram. Gostaria de aproveitar o momento e dizer que a Mocidade está devendo uma homenagem.
Quando eu chegava na concentração dos desfiles, sempre tinha uma pessoa que chegava antes de mim. Ele chegava de terno branco, sapato branco, chapéu branco e a camisa da Mocidade. Era Arnaldo Cidade, o famoso “Cidade”. Ele nunca deixou de desfilar pela escola. Quando eu chegava lá ele me perguntava: “- Pedrinho, nossa escola está descendo?”
E eu respondia: “Tá descendo. Tá vindo de Olaria.”